Na mensagem para a quaresma deste ano Bento XVI põe a tónica essencial na esmola.
"Este ano (...) desejo deter-me sobre a prática da esmola, que representa uma forma concreta de socorrer quem se encontra em necessidade e, ao mesmo tempo, uma prática ascética para se libertar da afeição aos bens terrenos."
"A esmola ajuda-nos a vencer esta incessante tentação, educando-nos para ir ao encontro das necessidades do próximo e partilhar com os outros aquilo que, por bondade divina, possuímos."
O apelo à esmola nestes termos revela que:
1. Somos uma Igreja de ricos e devemos ajudar os pobres, os necessitados. Nós não somos necessitados.
2. A esmola é importante para nós, ajuda-nos a vencer as nossas tentações, é uma prática ascética.
3. Em resumo: ainda bem que há pobres, para podermos dar as nossas esmolas, e ajudar à nossa salvação!
É este o discurso e a linguagem adequados para os dias de hoje?
Caro Paulo, há pontos importantes na mensagem para a Quaresma a propósito da esmola. Eu estou de acordo com a desatino da linguagem em relação aos dias de hoje. Por exemplo, quando diz que a esmola é "uma prática ascética para se libertar da afeição aos bens terrenos." isto desliza para o rançoso. É pena! Pena porque antes de mais não se aproveita o exemplo das imagens da Escritura citadas (nomeadamente no ponto 6 onde se fala em "treino" e "combate"). É conhecido o gosto de S. Paulo por metáforas extraídas do âmbito atlético e desportivo (coisa exageradamente popular no seu tempo). Digo isto porque sei que práticas ascéticas, hoje, há-as às dúzias e com muita visibilidade publicitária no domínio estético (pensem no ginásio e na dieta). No que respeita ao dinheiro as asceses não são tantas (quiçá a fazer jus ao ditado judeu de que se a caridade nada custasse o mundo estava cheio de benfeitores) mas podíamos estabelecer paralelismos entre a persistência com que gastamos no euro-milhões a espreitar uma oportunidade de ficarmos desafogados e o que gastamos para ajudar alguém.
ResponderEliminarTodavia, eu não vejo muito a ideia implícita de que somos ricos. Penso, aliás, que é justa distinção entre esmola e filantropia. Não que esta não seja positiva (infelizmente em Portugal foi coisa sempre escassa) mas os seus objectivos são distintos.
Caro Armando
ResponderEliminarObrigada por dares a tua achega a esta questão da esmola. Já sabemos que a chave é o Amor a Deus e ao Próximo. Mas na prática temos pouco "treino" e os "combates" nem sempre são orientados. A palavra "esmola" está um pouco desgastada e não surge como estímulo a uma atitude positiva. Esta questão do dar, do dinheiro, do aceitar, do repartir, do partilhar... parece-me muito importante. Se a leitura interactiva da mensagem do Papa para esta quaresma nos ajudar a crescer, a treinar, a combater pelo que entendemos valer a pena, será mais que útil!
dv
Obrigado pelos comentários. O que de facto me impressionou negativamente na mensagem de Bento XVI foi a linguagem que usa. Parece-me muito pouco ajustado aos dias que correm. Porque não falar em partilha em vez de esmola?
ResponderEliminarÉ urgente uma linguagem que seja compreendida pelas pessoas.
A este propósito aqui fica um excerto de um texto que gostei de José Tolentino Mendonça, que tb nos fala da esmola.
«Ao jejum está ligada a prática da esmola, que tem a sua modalidade mais autêntica na condivisão. Lê-se no profeta Isaías: "O jejum que Eu quero não será antes este: quebrar as cadeias injustas, desatar os laços de servidão…? Não será repartir o teu pão com o faminto, dar pousada aos pobres sem abrigo, levar roupa aos que não têm com que se vestir e não voltar as costas ao teu semelhante?". O jejum abre o nosso coração aos outros. A esmola testemunha-o no compromisso por um mundo fraterno.
Por isso, quando, ao começar a Quaresma, os cristãos recebem sobre a sua cabeça o sinal das cinzas, acolhem também a interpelação: "como tornar a cinza em lume?"»
O texto completo de José Tolentino de Mendonça pode ser lido aqui:
ResponderEliminarhttp://pela-positiva.blogspot.com/2008/02/como-tornar-cinza-em-lume.html