2007-02-20

No rescaldo do referendo ao aborto

Vale a pena ler na integra este artigo do António Marujo, no Público de hoje (sem link directo).

Concordo no essencial com ele.

E acho que é importante que após o referendo, em Igreja, se debata e reflicta sobre o resultado e as leituras que dele se podem e devem fazer.

Eis as ideias essenciais de António Marujo:

A doutrina oficial católica e de alguns sectores da Igreja em matéria de aborto tem vários alçapões, antes de tocar o problema maior. Essa foi uma razão para a derrota do "não" no referendo.
1. A recusa da educação sexual nas escolas, com medo dos "valores" que se perdem, da "ameaça" à família, da "redução" à biologia. (...) o cardeal-patriarca de Lisboa escreveu que a educação sexual "é bem-vinda e necessária". Mas essa não é a ideia de muitos responsáveis católicos.
2. A recusa da contracepção e do planeamento familiar. O planeamento familiar não é um problema do método que se utiliza, mas uma questão de como se educa para a maternidade e a paternidade responsáveis.
3. No aborto, há dramas sérios que as pessoas vivem, situações que só cada um, perante a sua consciência (perante Deus, para os crentes), pode avaliar. Em 1994, o Papa João Paulo II beatificou a italiana Gianna Beretta Molla que, em 1962, decidiu levar até ao fim uma gravidez de risco, sabendo que podia morrer e deixar viúvo o marido (que a apoiou) e órfãos os outros três filhos que já tinha. Uma decisão difícil e legítima. Uma mulher que decidisse abortar para não morrer e poder, assim, acompanhar marido e filhos, não deveria merecer o mesmo respeito da parte de quem anuncia, como se diz, o evangelho da misericórdia?
4. O discurso católico poderia ter sido o da compreensão perante o drama do aborto (por exemplo, para com os casos previstos na lei em vigor desde 1984). Poderia, mesmo, ter sido o de exigir que a lei fosse cumprida de forma a evitar o recurso ao aborto clandestino - esse, um mal maior. Mas ele foi sempre o de se opor ao que viria a seguir.
5. A mesma preocupação com o início da vida deveria existir para a vida em processo. É que ela só é digna com possibilidade de cada um se poder realizar, com comida, casa e trabalho acessíveis a todos.
Em 1984, quando a primeira lei sobre o aborto foi aprovada no Parlamento, o objectivo era o de acabar com o aborto clandestino. Oxalá que o país seja capaz, agora, de resolver o problema. Para que, daqui a mais 10 anos, não se esteja a votar num novo referendo.

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