Comentando e reflectindo sobre o Evangelho do passado domingo fiz referência ao drama que se vive em África, com milhares de pessoas, sobretudo crianças e velhos – os mais frágeis – a morrerem diariamente. Para acorrer a este drama tem sido feitos apelos por organismos internacionais e o Papa Bento XVI referiu-se em particular ao mesmo pedindo a colaboração de todos para ajudar a mitigar esta dramática situação.
Hoje ao ler o Evangelho deste domingo, não pude deixar de pensar nesta situação ao ouvir as palavras de Jesus: “Dai-lhes vós de comer”. De facto, perante o drama vivido em África como em tantas partes do mundo somos levados muitas vezes a pensar que a oferta que possamos fazer é tão pequena que de nada servirá para aliviar tão grande problema. Então esperamos que representantes de governos ou os que tem mais do que nós, os outros, façam aquilo que nós poderíamos fazer mas entendemos que de nada servirá.
Mas não servirá mesmo o pouco que possamos dar? Jesus, quando os discípulos lhe disseram que apenas tinham cinco pães e dois peixes não achou que tal era pouco e mandou-os distribuir esse pouco pela enorme multidão que se juntara para o ouvir. E não será isso também que nos pede hoje, tomarmos o que nos sobra, por pouco que seja, e reparti-lo com os que precisam? Claro que esta oferta será tanto maior quanto mais acreditarmos no poder do Senhor para multiplicar o pouco que damos e junto com outros poucos que outros possam dar fazer o muito que é necessário para que se cumpra o que nos pede no Evangelho de São Mateus: “viste-me com fome e deste-me de comer”.
Como naquela anedota de um homem que todas as semanas pedia ao Senhor que lhe fizesse sair a lotaria e a quem Deus respondeu “ao menos compra a cautela”, também nós que pedimos nas orações “Senhor dá pão aos que precisam” podemos comprar a nossa cautela e dar algum do pouco que possamos dispor juntando à nossa oferta a oração pedindo ao Senhor que na sua enorme bondade multiplique essa oferta para ajudar aqueles que dela precisam como fez quando multiplicou o pão e os peixes. Então o pouco que damos, junto ao pouco que muitos podem dar e a quem o Espírito Santo pode iluminar para que assim procedam, transforma-se no muito necessário para ajudar os que mais precisam.
Estas palavras que me surgem pela lembrança do drama de África não deixam de ser também verdade no nosso país face à crise que se vive e que muito se irá ainda fazer sentir. Talvez a passagem do Evangelho de São Lucas sobre a oferta da viúva pobre (Lc 21,1-4) nos possa inspirar deixando que as palavras de Jesus então proferidas ecoem no nosso coração: "Em verdade vos digo que esta viúva pobre deitou mais do que todos os outros; pois eles deitaram no tesouro do que lhes sobejava, enquanto ela, da sua indigência, deitou tudo o que tinha para viver.". Oxalá, pelo menos, sejamos capazes de repartir um pouco do que temos com os outros para cumprir o que Jesus hoje nos pede e que repito: “Não precisam de se ir embora: dai-lhes vós de comer.” Poderemos assim cumprir o que ouvimos na aclamação do Evangelho deste domingo: “Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus.” (Mt. 4,4b). De facto de que nos vale comermos o pão que o Senhor nos providencia se não formos capazes de nos alimentar das palavras que saem da Sua boca?
Termino com a transcrição de uma alegoria de um texto hoje distribuído a Capela de Gondarém e que bem podia aplicar-se a nós:
(…)
Um sacerdote morreu de repente, aos 81 anos. No seu bolso estava uma frase escrita pelo próprio punho que dizia: “A melhor parte da vida é aquela que está para a frente. O passado não é mais nosso, o futuro está nas mãos de Deus; nosso, inteiramente nosso, é o presente: O tempo é um presente de Deus.” (Citado de um texto de A. Colombo).
Vivamos o nosso presente pois é no hoje que todos os dias vivemos que preparamos o futuro que queremos alcançar. Amanhã poderá ser tarde e vermos as portas fecharem-se como às virgens que se descuidaram e não cuidaram de alimentar as suas candeias. Façamos deste dia o primeiro da nossa Vida.
Hugo Meireles
Diário da pandemia (17)
Há 4 anos
Sem comentários:
Enviar um comentário