2020-09-11

Diálogo com o Evangelho

 Diálogo com o evangelho deste Domingo, 13 de setembro, 24º do tempo comum, pelo Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui.






Evangelho segundo São Mateus (18, 21-35)

Naquele tempo, Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou-Lhe: «Se meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?».
Jesus respondeu: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete.
Na verdade, o Reino de Deus pode comparar-se a um rei que quis ajustar contas com os seus servos.
Logo de começo, apresentaram-lhe um homem que devia dez mil talentos.
Não tendo com que pagar, o senhor mandou que fosse vendido, com a mulher, os filhos e tudo quanto possuía, para assim pagar a dívida.
Então o servo prostrou-se a seus pés, dizendo: "Senhor, concede-me um prazo e tudo te pagarei".
Cheio de compaixão, o senhor daquele servo deu-lhe a liberdade e perdoou-lhe a dívida.
Ao sair, o servo encontrou um dos seus companheiros que lhe devia cem denários. Segurando-o, começou a apertar-lhe o pescoço, dizendo: "Paga o que me deves".
Então o companheiro caiu a seus pés e suplicou-lhe, dizendo: "Concede-me um prazo e pagar-te-ei".
Ele, porém, não consentiu e mandou-o prender, até que pagasse tudo quanto devia.
Testemunhas desta cena, os seus companheiros ficaram muito tristes e foram contar ao senhor tudo o que havia sucedido.
Então, o senhor mandou-o chamar e disse: "Servo mau, perdoei-te tudo o que me devias, porque mo pediste.
Não devias, também tu, compadecer-te do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?".
E o senhor, indignado, entregou-o aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia.
Assim procederá convosco meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar a seu irmão de todo o coração».

 

Diálogo com o Evangelho

Caros leitores,

Quando se fala de amor vêm logo à baila confiança, respeito, diálogo, fidelidade, atracção, paciência, mas raramente o perdão aparece como uma faceta importante do amor.

Acontece também que quando se fala de perdão, quase sempre vem acompanhado de “coitado”: 

- “Coitado, é tão boa pessoa, mas é muito nervoso... e perde facilmente a cabeça tornando-se agressivo!”

- “Coitado, é tão disponível...que quer ajudar toda a gente e não assume os seus compromissos!”

Mas se esta categoria tão tolerante de “coitado” ou de “coitadinho”, nos for dirigida a nós próprios, muito provavelmente não ficaremos satisfeitos, pois queremos ser tratados como pessoas capazes e responsáveis.

Não apreciamos ser perdoados porque somos uns “coitados”.

Jesus insiste muitas vezes sobre o perdão como uma faceta essencial do amor.

Para compreendermos melhor esta parábola é preciso termos uma ideia de quanto representaria, nos dias de hoje, a dívida de 10.000 talentos. Seria uma quantia enorme, calculada em 164 toneladas de ouro que alguém, mesmo com um bom salário, levaria uns milhares de anos a pagar, isto é, impossível de saldar.

O perdão de Deus, diz a parábola, vem da sua compaixão (literalmente: “das suas entranhas de mãe”), do seu amor que nos quer transformar, é apresentado como valendo mais do que essas toneladas de ouro.

Mas o perdão recebido tem uma exigência: perdoarmos também aos outros, como atitude essencial do amor ao próximo.

E por isso Jesus completa a parábola mostrando a mesquinhez do servo perdoado, que aperta, sem piedade, o pescoço do seu colega por causa duma pequena quantia de 100 denários (correspondendo apenas a cem dias de trabalho).

As ofensas que os outros nos fazem podem deixar marcas de desilusão e de mágoa que vão ter um efeito negativo na nossa vida.

Perdoar essas ofensas, em certas ocasiões, é bem superior às nossas forças. Mas o que nos é impossível a nós, é possível a Deus.

Para conseguirmos perdoar à maneira de Jesus, Ele deixou-nos no Pai-Nosso o pedido: “Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”.

Perdão recebido, perdão dado!

A experiência de ser verdadeiramente perdoado por alguém, que compreende a nossa fraqueza (por vezes bem miserável) e que renova a sua confiança em nós, apesar de não a merecermos de modo nenhum, é das atitudes de amor mais marcantes que podemos receber.

Esse perdão encoraja-nos a querer mudar a nossa conduta, a nos esforçarmos por não fazer mais esse mal, a querer deixar de ofender.

O perdão verdadeiro não nos trata como “coitados” ou “coitadinhos”, pelo contrário considera-nos capazes de ser responsáveis.

Como dizia alguém:

O perdão custa a pedir, mas é bom de receber. Custa a dar, mas todos o querem ter”.

frei Eugénio

 

2 comentários:

  1. Fico sempre intrigado com esta parábola e o ensinamento que a precede: metem finança e matemática à mistura com coisas que não são mensuráveis e não parecem ser de trocar como dinheiro.
    Mas estou de acordo, ser perdoado é uma posição de fraqueza e, deduzo, que perdoar seja uma posição de poder (pelo menos é nessa posição que se encontra o senhor da parábola)

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  2. Fico sempre intrigado com esta parábola e o ensinamento que a precede: metem finança e matemática à mistura com coisas que não são mensuráveis e não parecem ser de trocar como dinheiro.
    Mas estou de acordo, ser perdoado é uma posição de fraqueza e, deduzo, que perdoar seja uma posição de poder (pelo menos é nessa posição que se encontra o senhor da parábola)

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