Diálogo com o Evangelho deste Domingo, 24 de janeiro, 3º Domingo do tempo comum, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui.
EVANGELHO (Mc 1, 14-20)
Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia
e começou a proclamar o Evangelho de Deus, dizendo:
«Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus.
Convertei-vos e acreditai no Evangelho».
Caminhando junto ao mar da Galileia,
viu Simão e seu irmão André,
que lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores.
Disse-lhes Jesus:
«Vinde comigo e farei de vós pescadores de homens».
Eles deixaram logo as redes e seguiram-n’O.
Um pouco mais adiante, viu Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João,
que estavam no barco a consertar as redes; e chamou-os.
Eles deixaram logo seu pai Zebedeu no barco com os assalariados e seguiram Jesus.
Palavra da salvação.
DIÁLOGO
Jesus começa a sua pregação proclamando: "Está próximo o Reino de Deus. Convertei-vos e acreditai no Evangelho».
Foi essa a essência da mensagem e da atividade de Jesus.
O Evangelho de Marcos não realça tanto as pregações de Jesus, como as suas ações, pois Marcos pretendia demonstrar que através dessas ações Jesus encarnava o Reinado de Deus.
Jesus inaugurou o Reinado de Deus na História, com a sua obediência a Deus-Pai e a sua intimidade com Ele e oferecendo a todas as pessoas poderem também participar nessa intimidade divina.
Jesus inaugura um estilo de vida e de comportamento, que pela sua novidade, vai encontrar muitas resistências no mundo religioso quer judaico, quer greco-romano.
É, pois, necessário que os seus ouvintes se preparem para ter de mudar de mentalidade religiosa, para poderem aceitar o modo como Jesus falava de Deus e com Deus, a si mesmo e ao próximo.
Isso implicava um modo de viver diferente.
Essa transformação é chamada conversão, que corresponde à palavra grega metanoia.
Em que consistia essa novidade tão grande?
Pensemos numa situação, aparentemente simples para nós.
Quando Jesus se dirigia a Deus, tratava-O por “Abba!”, que, como sabemos, quer dizer “papá, paizinho” como as crianças na Palestina tratavam os seus pais.
Conseguimos imaginar o enorme atrevimento que isso representava, por rebaixar Deus ao nível dum pai humano e falível?
Além disso, era uma pretensão de proximidade, e de grande intimidade com Deus, inimaginável para quem tinha um tal respeito pelo Deus da Criação e da Aliança que nem o seu Nome se podia pronunciar.
Era intolerável, era uma blasfémia mesmo, que parecia destruir o essencial da religião judaica.
Também no Reinado de Deus, que Jesus inaugurou, deixou de haver a separação fundamental entre os membros do Povo Eleito e os chamados pagãos, que seguiam outras crenças e religiões. Todos passaram a ser considerados filhas e filhos de Deus, um Pai e assim passavam todos a fazer parte duma imensa fraternidade.
Esta outra mudança que Jesus trouxe que era demasiado radical.
A conversão, a mudança de mentalidade era fundamental para que os ouvintes de Jesus pudessem acreditar no Evangelho, nas “boas notícias” que Ele apresentava e praticava.
Acreditar no Deus que Jesus nos apresenta tem um carácter de decisão, de opção.
Uma opção que não é de um dia, ou de uma ocasião, mas uma opção para todos os momentos ao longo da vida.
A conversão, realiza uma transformação no nosso interior, no nosso ser.
É Deus e a Sua Vontade que se tornam a fonte do nosso agir e do nosso estilo de vida.
A conversão, permite-nos sonhar, com os sonhos que só o Espírito de Deus nos pode inspirar.
Esta mudança, permite ter uma certeza cheia de fé, de que a comunhão com Deus, e com toda a criação se passa já no desenrolar da História e lhe dá o significado final.
Marcos mostra no seguimento desta página do Evangelho, como a metanoia se concretizou no chamamento dos primeiros discípulos.
Jesus viu uns pescadores, à beira do Mar da Galileia e convidou-os para uma transformação total na vida deles.
Será que estes pescadores já tinham alguma vez ouvido Jesus a pregar?
Teriam eles refletido sobre as promessas que ele apresentava?
Teriam já tido algumas discussões sobre ele?
Não sabemos, mas é possível que tenha acontecido!
Mas desta vez, ouvem-no dizer-lhes diretamente: "Vinde comigo”.
É Ele próprio, Jesus em pessoa, que se dirige a eles e lhes propõe uma total mudança de vida.
Marcos diz-nos que eles deixaram tudo imediatamente, dois deles até deixaram o seu pai sozinho para terminar o dia de trabalho na pesca.
O que é que pode ter motivado a decisão tão rápida que tomaram, de mudar completamente de vida familiar e profissional, aceitando o convite de Jesus?
O que é que pode estar na base da opção que tomaram por seguir Jesus e pelo seu modo de viver e de se relacionar com os outros, fazendo a Vontade de Deus?
Foi a sua conversão a Jesus, pondo-O no centro das suas vidas, como Alguém por quem valia a pena tudo arriscar.
É isso que a conversão faz, mudando as prioridades e os discernimentos.
É uma proposta de "tudo ou nada".
A conversão destes pescadores e as de outras e outros discípulos de Jesus, apesar de tão radical, não funcionou automaticamente. As suas decisões de seguir Jesus não os transformou de um momento para o outro.
Tiveram de aprender a vivê-la através duma árdua e demorada aprendizagem com o Mestre.
Sabemos também que Jesus não pediu a todas e a todos que deixassem tudo para trás. Discípulos como Zaqueu, Marta, Maria e Lázaro, a samaritana, Nicodemos e outras e outros, viveram a sua metanoia em casa, em família, com as suas profissões.
A conversão, a metanoia, tem a ver com a transformação que se opera no modo de nos relacionarmos com Deus e deixarmos que Ele se relacione connosco, sobretudo pela oração, como Jesus a praticava, querendo o que Deus quer.
Conhecemos certamente pessoas, do passado e do presente, que permitiram que o sonho do Reinado de justiça e amor de Deus se tornasse realidade nas suas vidas.
Somos convidados ao mesmo.
frei Eugénio
Só de pensar como houve encontros nas nossas vidas que mudaram tanta coisa!...
ResponderEliminarComo foi, é o encontro com Jesus? O que ainda esperamos desse encontro?