2022-07-17

Diálogo com o Evangelho

Diálogo com o Evangelho do 16º Domingo do Tempo Comum, 17 de julho, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui

 

www.evangile-et-peinture.org


Evangelho (Lc 10, 25 - 37) 

Naquele tempo, Jesus entrou em certa povoação e uma mulher chamada Marta recebeu-O em sua casa. 

Ela tinha uma irmã chamada Maria, que, sentada aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra. 

Entretanto, Marta atarefava-se com muito serviço. Interveio então e disse: «Senhor, não Te importas que minha irmã me deixe sozinha a servir? Diz-lhe que venha ajudar-me».

O Senhor respondeu-lhe: «Marta, Marta, andas inquieta e preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada».

 

DIÁLOGO

“Marta, Marta, andas inquieta e preocupada com muitas coisas”,

diz Jesus à Marta.

 

Mas a Maria Ele diz que ela escolheu a melhor parte.

Ficamos sempre um pouco surpreendidos com este episódio do Evangelho, que nos aparece mesmo como chocante.

Conheço algumas mulheres que me dizem que não suportam esta passagem, que as perturba, pois desvaloriza todas as energias que empregam dedicando-se à família, aos filhos e aos netos.

 

Depois da parábola do bom samaritano, que lemos no Domingo passado, parece impensável que o evangelista sugira que a pregação ou o estudo da Palavra tenham prioridade absoluta sobre o serviço direto, como fez o samaritano.

 

Convém ter em atenção que neste relato, tanto Marta como Maria saem dos papéis tradicionais das mulheres.

Marta parece ser a chefe da família, aquela que acolheu Jesus na sua casa.

O serviço de Marta é descrito como sendo literalmente diaconal; ela estava a servir como Jesus serviu. (Ver Luc. 22,26-27).

Por seu lado, enquanto ela trabalha, Maria senta-se na posição de discípula aos pés de Jesus, que aparece como  mestre, numa posição física e num papel tradicionalmente restrito aos homens.

 

Marta pediu a Jesus para intervir porque o trabalho (daikoneo) lhe foi deixado enquanto Maria aceitava a palavra de Jesus (logótipos).

O seu paralelo mais próximo no Novo Testamento vem de Actos 6, onde é dito que à medida que o número de discípulos crescia, a comunidade escolhia sete "diáconos", para fazerem serviço de mesa, libertando os líderes apostólicos para pregar a Palavra.

Tendo em atenção a ligação que Lucas faz entre os dois acontecimentos, percebemos que ele pode estar a descrever o serviço de Marta como sendo semelhante ao de um diácono.

A comunidade precisava que alguns servissem como anfitriões à mesa fazendo «diakoneo», deixando outros livres para serem pregadores itinerantes da Palavra «logótipos».

 

Partindo deste facto da vida corrente, conhecido de todos, pois sabemos como se deve receber uma "visita", Jesus quer mostrar-nos e ensinar-nos como devemos receber as visitas de Deus nas nossas vidas. Como receber Deus na vida quotidiana: no trabalho, nos transportes que usamos, nos momentos de oração, em casa, nos tempos de descanso, nas idas às compras, nas Eucaristias dominicais, etc., etc.

 

Nesta passagem do Evangelho, são Marta e Maria que manifestam hospitalidade, que recebem Jesus, mestre da Boa Nova de Deus.

Mas o evangelista põe em destaque que não é o acolhimento feito pelas duas irmãs aos visitantes, mas que é Jesus que as recebe, que lhes traz a Sua presença, que lhes abre a Sua intimidade.

É o visitante Jesus, que partilha a Sua presença com as irmãs visitadas.

A chamada de atenção de Jesus a Marta, “andas preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária” não é uma crítica ao que ela estava a fazer pelos visitantes, mas um aviso.

Jesus, em poucas palavras, está a dizer a Marta e a nós também:

"Tem cuidado de te preocupares sobretudo em fazeres coisas pelos outros e não estares com as pessoas que te visitam".

O que é central para Jesus é «estarmos-com» e não «fazer-para».

 

Como é que podemos viver isso?

Comecemos por estar disponíveis para escutar os outros, dispondo do nosso tempo, interessando-nos por quem eles são e não partindo do princípio que já sabemos do que eles precisam. Não devemos focar as nossas energias no que queremos fazer para eles.

Jesus convida-nos a sermos pessoas cujas atividades de serviço, de dedicação e de generosidade (como Marta) devem ser animadas pelo desejo de escutar Jesus, em oração (como Maria).

Jesus propõe-nos que procuremos ser "Marias-Martas".

 

Para isso, é preciso encontrarmos momentos de «paragem», mesmo que sejam apenas alguns minutos aqui e ali, durante o dia, ou mesmo de noite, se estamos acordados, para «estarmos com Jesus em oração».

As férias, quando as temos, são uma boa altura para procurarmos fazê-lo com mais tempo e menos pressa.

Que este Evangelho nos ajude a acolher Jesus que nos visita de modos tão variados e mesmo surpreendentes.

Jesus disse: «Eis que estou à porta e bato, se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e comerei com ele, e ele comigo» (Apoc. 3, 20).

 

Que bom que é, quando nos apercebemos disso, na fé!

Se abrirmos a porta do nosso coração, a visita do Senhor irá mudar-nos para melhor, como Jesus quer e deseja para cada um de nós.

 

        frei Eugénio op

 

 

Sem comentários:

Enviar um comentário