Diálogo com o Evangelho do 30º Domingo do Tempo Comum, 29 de outubro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui. (ainda não disponível)
Evangelho (Mt. 22, 15-21)
Naquele tempo,
os fariseus, ouvindo dizer que Jesus tinha feito calar os saduceus,
reuniram-se em grupo,
e um doutor da Lei perguntou a Jesus, para O experimentar:
«Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?»
Jesus respondeu:
«‘Amarás o Senhor teu Deus
com todo o teu coração, com toda a tua alma
e com todo o teu espírito’.
Este é o maior e o primeiro mandamento.
O segundo, porém, é semelhante a este:
‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo’.
Nestes dois mandamentos se resumem
toda a Lei e os Profetas».
Palavra da salvação.
DIÁLOGO
Nos nossos diálogos dos últimos Domingos e neste também, Jesus é interpelado com perguntas preparadas pelos mais doutos e notáveis religiosos do judaísmo, que procuram apanhar Jesus em falha, para o levar à condenação como falso Messias.
A todas essas perguntas armadilhadas, Jesus respondeu com uma perspetiva mais ampla. Desta vez o porta-voz é um teólogo moralista que lhe faz a pergunta mais básica de todas para um judeu: " Qual é o maior mandamento da Lei?»
Ele fez a pergunta central de todos os crentes: "O que é que Deus espera da humanidade?"
A resposta de Jesus foi a que esse teólogo e os seus companheiros esperavam.
Quando Jesus disse: “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu espírito”, estava a dizer uma oração do Deuteronômio 6: 4-5, que todos os judeus piedosos recitam diariamente de manhã e à noite, e que esperam que seja a última prece que dirão na hora da morte.
É a chamada SHEMÁ: “Escuta Israel: o Senhor nosso Deus é o único Senhor, e amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu espírito”.
É o apelo de Deus que liberta e salva o povo e com quem faz uma aliança. Deus pede uma resposta de fé, com todas as forças humanas, no reconhecimento da sua bondade e grandeza únicas.
Em seguida Jesus, vai além da pergunta do doutor da Lei e acrescenta o segundo mandamento da Aliança, “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”, mas acrescentando que este mandamento é semelhante ao primeiro.
Se é semelhante, quer dizer que faz corpo com o primeiro, de certo modo deixa de ser segundo. Os dois são inseparáveis para Deus, diz Jesus.
É como se dissesse: o grau do teu amor a Deus verifica-se pela qualidade do teu amor ao próximo.
"Amarás o teu próximo como a ti mesmo."
No Sermão da Montanha, que o evangelista Mateus reúne nos capítulos 5 a 7, Jesus faz um apelo ao amor ao próximo, incluindo os inimigos.
Ao dizer que o amor ao próximo é semelhante ao amor a Deus,
Jesus declara que eles dois amores estão intimamente ligados num modo de vida como Deus quer.
Jesus pede um amor em quatro dimensões: amor a Deus, amor a si mesmo, amor àqueles que estão afetivamente mais próximos de nós, e amor àqueles cujos objetivos e modos de vida são totalmente diferentes, ou mesmo opostos aos nossos.
Quando analisamos essas quatro dimensões de uma vida de amor, vemos que somos chamados a amar em duas direções:
Uma direção para o amor aos familiares e aos que nos são semelhantes e a outra direção para o amor aos que não são como nós.
Para muitas pessoas o amor a si mesmo e aos mais próximos, o amor por aqueles que pensam e agem de modo semelhante ao nosso, vem de certo modo, naturalmente. Esse amor consolida a nossa personalidade como pessoas-de-relação e dá-nos calor humano.
Mas Jesus convida-nos a ir mais longe e a aprender a amar quem pensa e age de maneira diferente e até oposta à nossa.
Jesus diz-nos que o amor a Deus e ao amor ao próximo são duas dimensões inseparáveis do mesmo Amor que Deus quer e Ele veio manifestar.
Santa Catarina de Sena na sua obra-prima “O Diálogo” na qual relata os diálogos de Deus com ela, exprime-o de uma forma simples que partilho convosco.
Deus diz-lhe:
“Quem Me ama procura ser útil ao próximo. Nem poderia ser de outra maneira, dado que o amor por Mim e pelo próximo, são uma só coisa. Tanto alguém ama o próximo, quanto Me ama, pois de Mim se origina o amor do outro.”
“Como nada podeis fazer de útil para Mim, deveis ser de utilidade ao homem.”
”Quem se apaixona por Mim, jamais cessa de trabalhar pelos outros, de modo geral ou particular, com maior ou menor empenho, segundo as disposições do beneficiado e do benfeitor.”
“Assim, graças ao amor que o une a Mim, o homem torna-se útil ao próximo; preocupado com a salvação alheia, ama o próximo, presta-lhe serviços em suas necessidades.”
In “O Diálogo” n° 2.7 (É no homem que se ama a Deus)
frei Eugénio (25.10.2020)