2024-08-11

Diálogo com o Evangelho

Diálogo com o Evangelho do XIX Domingo do Tempo Comum, 11 de agosto, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui. (gravado em agosto de 2021)

 

 

 Evangelho (Jo. 6, 41-51)

Naquele tempo, os judeus murmuravam de Jesus, por Ele ter dito: «Eu sou o pão que desceu do Céu».
E diziam: «Não é Ele Jesus, o filho de José? Não conhecemos o seu pai e a sua mãe? Como é que Ele diz agora: "Eu desci do Céu"?».
Jesus respondeu-lhes: «Não murmureis entre vós.
Ninguém pode vir a Mim, se o Pai, que Me enviou, não o trouxer; e Eu ressuscitá-lo-ei no último dia.
Está escrito no livro dos Profetas: "Serão todos instruídos por Deus". Todo aquele que ouve o Pai e recebe o seu ensino vem a Mim.
Não porque alguém tenha visto o Pai; só Aquele que vem de junto de Deus viu o Pai.
Em verdade, em verdade vos digo: quem acredita tem a vida eterna.
Eu sou o pão da vida.
No deserto, os vossos pais comeram o maná e morreram.
Mas este pão é o que desce do Céu, para que não morra quem dele comer.
Eu sou o pão vivo que desceu do Céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que Eu hei de dar é a minha carne, que Eu darei pela vida do mundo».
 

DIÁLOGO

Quando Jesus disse: "Eu sou o pão que desceu do céu", os seus ouvintes compreenderam o suficiente para não o rotularem de louco, por afirmar ser "pão da vida", mas vão distanciar-se e mesmo opor-se, por causa da afirmação «que desceu do Céu», o que queria dizer que Ele se considerava o Enviado de Deus.

 

Ser “pão da vida” quer dizer que é a Pessoa mesmo de Jesus que nos pode fazer viver para sempre, porque Ele é a Palavra de Deus tornada humana.

 

Jesus é Aquele que recebe tudo de Seu Pai: a sua missão, as suas obras, as suas palavras, até mesmo os seus discípulos.

 

Se Jesus é o único que revela completamente Deus, é porque é o único que conhece perfeitamente Deus-Pai.

 

Na ocasião da sua vida, em que Jesus fez esta pregação, estava a encontrar um ambiente de cada vez maior hostilidade e agressividade da parte das autoridades religiosas e políticas, a que o evangelista João chama “judeus”. Não se refere a todo o povo hebreu, mas somente às autoridades de Jerusalém que tinham tomado posição contra Jesus, até conseguirem que Ele fosse condenado à morte por crucifixão.

 

De modo mais amplo, o evangelista quer referir-se a todos os que recusaram acolher e escutar Jesus.

Os “judeus” falavam do pai de Jesus, José. Mas Jesus falava do seu verdadeiro Pai. Por sua vez, é o Pai que leva as pessoas até Jesus, para que elas reconheçam que Ele é o alimento que desceu do Céu.

 

As autoridades estavam firmemente convencidas que ninguém que eles conhecessem com origens tão humildes como as de Jesus, pudesse ser o Messias de Deus. Recusavam-se a acreditar que Jesus, um homem demasiado conhecido em Nazaré, pudesse ser o Enviado de Deus.

Ao mesmo tempo, nessa recusa, também negavam que Deus se pudesse preocupar com eles e que tivesse a iniciativa de revelar algo de novo sobre Ele e o Seu Projeto para o mundo.

 

Lamentavelmente, as pessoas a quem Jesus se dirigiu em Cafarnaum, contentaram-se com “murmurações”, isto é, falar mal de alguém, sem falar diretamente a essa pessoa, num EU-TU, que permita respeito mútuo, mesmo na discordância.

Jesus vai interpelá-los, para que eles deixem a «murmuração» e se decidam a dialogar com Ele acerca dos argumentos em que baseiam a sua oposição. Se o fizessem, poderiam pôr-se em questão e abrir-se ao Enviado de Deus.

 

E a nós, leitores do Evangelho neste tempo em que vivemos, a que é que Jesus nos convida?

Parece-me que antes de mais, Jesus está a desafiar-nos a reconhecermos quanto as nossas «murmurações», com queixas e críticas frequentes sobre o que se passa de mal, podem tornar-se num obstáculo para ouvirmos e acolhermos os convites que Deus nos vai dirigindo, através de pessoas e de acontecimentos.

Murmurar é mais fácil do que acreditar e rezar.

 

Se acreditamos que o Pai de Jesus é também nosso Pai, «Abba», Pai querido, e se acreditamos que Jesus é o Seu Enviado, que veio de junto do Pai, e que nos deixou o Seu Espírito, é a Ele que diretamente que nos podemos dirigir.

Quer nas nossas lágrimas e provações, quer nas situações que nos chegam de mais perto ou de mais longe, com tantos dramas humanos, é a Jesus que nos podemos dirigir, num EU-TU, interpelando-O e questionando-O sobre o que se passa e nos indigna e faz sofrer tantas pessoas, quer fazendo os possíveis por O escutar, com confiança, para acolhermos os seus apelos à nossa colaboração com Ele.

 

A última frase desta passagem do Evangelho é surpreendente:

“E o pão que Eu hei-de dar é a minha carne, que Eu darei pela vida do mundo”.

A “carne” de que Jesus fala aqui não é o seu organismo biológico, é toda a sua Pessoa que vive e age através dos seus atos e palavras.

E “comer”, deve ser entendido no seu significado simbólico:

Jesus quer permanecer em nós e nós com Ele (Jo 6,56).

É esta inimaginável intimidade que nos é oferecida, na fé.

 

Deus, no Seu Amor por nós, não desiste de nós. Podemos mesmo dizer, que Deus já não pode viver sem nós!

 

 frei Eugénio, op (07.08.2021)

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