Diálogo com o Evangelho do 4º Domingo da Quaresma, 30 de março, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui. (gravado em 26.03.2022)
Evangelho (Lc 15,1-3.11-32)
Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximavam-se todos de Jesus, para O ouvirem.
Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo: «Este homem acolhe os pecadores e come com eles».
Jesus disse-lhes então a seguinte parábola:
«Um homem tinha dois filhos.
O mais novo disse ao pai: "Pai, dá-me a parte da herança que me toca". O pai repartiu os bens pelos filhos.
Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta.
Tendo gastado tudo, houve uma grande fome naquela região, e ele começou a passar privações.
Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o mandou para os seus campos guardar porcos.
Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava.
Então, caindo em si, disse: "Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome!
Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti.
Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me como um dos teus trabalhadores".
Pôs-se
a caminho e foi ter com o pai. Ainda ele estava longe, quando o pai o
viu: enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço,
cobrindo-o de beijos.
Disse-lhe o filho: "Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho".
Mas o pai disse aos servos: "Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés.
Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos,
porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado". E começou a festa.
Ora, o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças.
Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo.
O servo respondeu-lhe: "O teu irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e salvo".
Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com ele.
Mas
ele respondeu ao pai: "Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca
transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma
festa com os meus amigos.
E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo".
Disse-lhe o pai: "Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu.
Mas
tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava
morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado"».
DIÁLOGO
Nesta parábola Jesus dirige-se a um grupo de fariseus e de escribas que discordavam e se opunham às atitudes d’Ele porque acolhia e até ia comer a casa de pecadores.
Habitualmente esta parábola é conhecida com a «parábola do filho pródigo». É utilizada para levar os cristãos a terem atitudes de arrependimento pelo mal feito e a celebrarem o Sacramento do Perdão.
Se seguirmos o texto da parábola, como se fosse um vídeo, vemos que Jesus utilizou muitos detalhes visuais: o filho mais novo a pedir a sua herança; a sua partida para um país distante onde se se fartou de divertir e de gastar dinheiro; o filho na pocilga com os porcos; depois o filho a refletir e a cair em si mesmo; o pai a ir abraçar o filho no seu regresso a casa; o banquete preparado pelo pai; o irmão mais velho zangado não quer entrar na festa; o pai que vai ao encontro do filho mais velho.
Qual é a mensagem de Jesus nesta parábola?
Será o perdão? Mas o pai não disse nenhuma palavra sobre perdão ou absolvição.
Mesmo quando o irmão mais velho resmungou com o pai por ele
ter acolhido festivamente o filho mais novo, o pai não disse nada que
desculpasse o comportamento desse filho.
No final destas cenas cheias de vida, vem a mensagem que Jesus quer que descubramos: "Este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi encontrado".
Esta frase é retomada pelo pai quando vai ter com o filho mais velho, que repreende o seu pai por ter tratado com tanta bondade um filho que o abandonou: «teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado».
O pai lembra ao filho mais velho que ele tem um irmão, que estava dado como morto e que afinal está vivo.
A dádiva que o pai deu a este filho, que o abandonou e que andou numa independência desorientada foi a compaixão.
Podemos chamar a esta parábola «A parábola do Pai cheio de compaixão».
A atitude de compaixão, na língua hebraica «rahamim» tem a ver com as entranhas, com seio materno, para exprimir que a compaixão vem bem de dentro, como o amor de mãe pelo filho que ela trouxe no seu ventre.
A compaixão é uma das atitudes mais consoladoras e renovadoras nas vidas das pessoas.
Na parábola, a compaixão do pai conduz à mudança de atitude e também à mudança de coração do seu filho mais novo. Quando ao filho mais velho, a parábola não o diz, mas podemos esperar que também ele tenha aceitado mudar.
Mas, a história do filho mais novo inclui a do filho mais velho.
Este está ressentido. Nem mesmo o regresso do seu irmão o fará querer participar na celebração familiar.
Mas o pai vai ter com o filho mais velho, tal como tinha ido ao encontro do mais novo. Ele quer que ambos se descubram como irmãos e que se alegrem com o bem um do outro.
Jesus apresenta-nos Deus como Pai que só quer ter uma autoridade a da compaixão. Esta compaixão faz com que todas as formas de desamor e de sofrimento dos seus filhos, causem uma imensa tristeza no seu coração.
É, por isso, que na parábola o pai estende os braços sem se cansar na direção dos seus filhos, esperando que eles vão ter com Ele e queiram participar na alegria da festa do Amor eterno.
Nesta nossa caminhada para a Páscoa deixemos espaço em nós para a compaixão para com as nossas irmãs e irmãos, pois a compaixão pode mudar a história das nossas vidas.
frei Eugénio, op (2022.03.26)