2012-04-19

CRISE NA IGREJA CATÓLICA


O jornal PÚBLICO de domingo passado, dia 15 de Abril, publica um extenso artigo assinado pelo jornalista António Marujo com o título “Ambiente de fim de pontificado e um Papa sem mão na Cúria”. O artigo refere-se aos problemas que de há muito assolam a Igreja e tem gerado o aparecimento de movimentos de contestação no seio dos católicos. Abre-se, assim, mais um debate na Igreja Católica e este é, no meu entender, um tema que nos deve merecer profunda reflexão e um diálogo aberto pois o que está em causa é o futuro do catolicismo e da Igreja como a conhecemos hoje em dia.

Um dos mais expressivos sinais desta crise que se vem instalando, desde há muito, no seio da Igreja Católica foi o que deu origem ao Movimento Internacional Nós Somos Igreja (IMWAC) fundado em 1996, em Roma, na sequência de um referendo iniciado em 1995 na Áustria, Alemanha e Tirol do Sul e que recolheu 2,5 milhões de assinaturas. Esse referendo apelava a uma renovação da Igreja Católica Romana em consonância com o Concílio Vaticano II.

Apesar destes sinais de que estava a despertar na Igreja Católica uma nova e mais esclarecida consciência dos homens e mulheres que procuram aprofundar a sua fé e participar mais activamente numa Igreja de que sentem fazer parte activa e não passiva, a abertura prenunciada pelo Concílio Vaticano II, da qual as posições que tem vindo a ser assumidas por estes grupos de católicos faz eco, tem sido, em muitos e importantes aspectos, manifestamente ignorada pelo Vaticano.

No artigo agora publicado, o jornalista dá notícia do mais recente movimento de contestação à Cúria Romana, o qual tem origem num manifesto de padres austríacos, publicado no Domingo da Trindade, 19 de Junho de 2011. Nesta iniciativa (Die Pfarrer-Initiative), os referidos párocos afirmam o seguinte:
 A recusa de Roma a uma reforma da Igreja há muito esperada e a inatividade dos nossos bispos não só nos permitem, mas também nos obrigam a seguir a nossa consciência e a agir de forma independente.
Nós, padres, queremos estabelecer, no futuro, os seguintes sinais:
1.     Rezaremos, no futuro, em todas as Missas, uma oração pela reforma da Igreja. Levaremos a sério a palavra da Bíblia: pedi e receberei. Diante de Deus, existe a liberdade de expressão.

2.     Não recusaremos, em princípio, a Eucaristia aos fiéis de boa vontade. Isso é especialmente verdadeiro aos divorciados de segunda união, aos membros de outras Igrejas cristãs e, em alguns casos, também aos católicos que abandonaram a Igreja.

3.     Evitaremos celebrar, se possível, nos domingos e dias de festa, mais de uma Missa ou de encarregar padres em viagem ou não residentes. É melhor uma liturgia da Palavra organizada localmente do que tournées litúrgicas.

4.     No futuro, vamos considerar uma liturgia da Palavra com distribuição da comunhão como uma "Eucaristia sem padre", e assim nós a chamaremos. Dessa forma, cumpriremos a nossa obrigação dominical em tempos de escassez de padres.

5.     Rejeitaremos também a proibição da pregar estabelecida para leigos competentes e qualificados e para professoras de religião. Especialmente em tempos difíceis, é necessário anunciar a Palavra de Deus.

6.     Comprometer-nos-emos a que cada paróquia tenha o seu próprio superior: homem ou mulher, casado ou solteiro, de tempo integral ou parcial. Isso, no entanto, não por meio das fusões de paróquias, mas sim mediante um novo modelo de padre.

7.     Por isso, vamos aproveitar todas as oportunidades para nos manifestar publicamente em favor da ordenação de mulheres e de pessoas casadas. Vemo-los como colegas, e colegas bem-vindos, ao serviço pastoral.
A posição desassombrada assumida neste novo manifesto estava, em parte, patente na declaração do movimento “Nós Somos Igreja”, sendo a maior radicalidade deste novo manifesto dos padres austríacos um sinal do agudizar da crise e da reacção à “surdez” e passividade com que a Cúria Romana e grande parte da Igreja hierárquica tem encarado estas manifestações de um número cada vez maior de católicos. Fala-se agora do medo de um novo cisma na Igreja Católica o qual, em minha opinião, só poderá vir a existir se a Cúria Romana continuar a ser insensível a este despertar de consciência daqueles que fazem parte com o mesmo direito da Igreja de Jesus Cristo.

Porque é importante que todos os que seguem Jesus se preocupem na construção desta Igreja que Ele nos deixou em “herança” penso ser a leitura e reflexão sobre este documento, como dos anteriores documentos do movimento “Nós Somos Igreja”, um desafio para quem se quer assumir como um católico consciente e esclarecido.

Ainda a este propósito valerá a pena reler a primeira leitura do dia de hoje, quarta-feira, dia 18 de Abril (Livro dos Actos dos Apóstolos 5,17-26), assim como reflectir na última frase do Evangelho deste mesmo dia (Evangelho segundo S. João 3,16-21) onde se lê “… quem pratica a verdade aproxima-se da Luz, de modo a tornar-se claro que os seus actos são feitos segundo Deus”.

Hugo Meireles

1 comentário:

  1. É urgente, de facto, que a Igreja se abra à reflexão crítica sobre o seu modo de funcionar e de testemunhar a fé em que acredita. Este movimento austríaco é uma sinal forte de inconformismo que urge ouvir. Porque o problema maior é dos que nem discutem: limitam-se a ir embora...

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