Diálogo com o Evangelho do 32º Domingo do Tempo Comum, 6 de novembro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui.
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EVANGELHO (Lc 20, 27.34 - 38)
Naquele tempo, aproximaram-se de Jesus alguns saduceus
– que negam a ressurreição – e começaram a interrogá-l’O.
Disse-lhes Jesus:
Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento.
Mas aqueles que forem dignos
de tomar parte na vida futura e na ressurreição dos mortos,
nem se casam nem se dão em casamento.
Na verdade, já não podem morrer, pois são como os Anjos,
e, porque nasceram da ressurreição, são filhos de Deus.
E que os mortos ressuscitam,
até Moisés o deu a entender no episódio da sarça ardente,
quando chama ao Senhor
‘o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob’.
Não é um Deus de mortos, mas de vivos, porque para Ele todos estão vivos».
DIÁLOGO
A fé na ressurreição tem, na Bíblia, uma longa história.
Os primeiros crentes, como Abraão e Moisés, não viram uma vida depois da vida.
A sua fé comprometeu-os aqui na Terra, na sua busca da melhor maneira de agradar ao Deus da Aliança que se lhes tinha manifestado.
Ansiavam pelos dias de paz e de felicidade nas suas vidas que Deus Criador lhes tinha dado.
Foi perante o destino terreno de pessoas justas diante de Deus que, por vezes como Job, experimentaram a miséria e o fracasso, que se levantou a questão de uma vida após a morte.
E, no livro de Job encontramos uma primeira afirmação de fé numa vida que continua para além do tempo, nesta bela passagem que lemos frequentemente em funerais:
“Sei que o meu Defensor está vivo e que no fim se levantará sobre o pó; depois do meu despertar, levantar-me-á junto d’Ele, e em minha carne verei a Deus. Aquele que eu vir será para mim, Aquele que meus olhos contemplarem e não será um estranho." (Job 19:25-27).
Job teve a intuição de uma vida humana que se estendia até à vida eterna, com Deus.
É este ensinamento que Jesus conhece e os seus opositores fazem questão de lhe apresentar objeções:
Como é que alguém se encontra numa vida após a morte, onde não há matéria?
E quanto aos laços entre marido e mulher, o que se passará?
O que é que permanecerá de cada pessoa? Como é que isso vai acontecer?
Estas são perguntas importantes, que ainda hoje nós fazemos, procurando respostas.
Lembro-me de uma senhora de mais de 90 anos me perguntar, quando eu a ia visitar:
"Frei, depois de morrer verei o meu marido, como ele é?
Poderei falar e estar com ele?
Irei poder ver os meus filhos e netos que continuam cá na Terra?
Irei ver também os meus pais, de que tanto gostei e de quem tanto recebi?
Com estas questões, eu ficava numa situação um pouco semelhante à de Jesus.
Vejamos que Jesus não respondeu diretamente aos seus opositores.
Disse-lhes que deviam primeiro pensar que são "filhos de Deus” e que o seu Deus não é "o Deus dos mortos, mas dos vivos", como narra o Evangelho que acabamos de ler.
Esta resposta de Jesus deixa-nos certamente insatisfeitos, mas abre a porta a uma compreensão mais profunda da ressurreição, que não é apenas um estado de vida em que um dia nos encontraremos, mas que tem a ver com a pessoa de Jesus que disse: "Eu sou a Ressurreição e a Vida" (João 11,25).
No Credo que proclamamos habitualmente nas missas de Domingo, podemos afirmar que acreditamos na "ressurreição da carne", porque acreditamos que Jesus ressuscitou em corpo e alma e que nos prometeu que nos havia de levar com Ele.
"Se Cristo não ressuscitou, a minha fé é em vão" (I Coríntios 15,17), diz São Paulo.
Não temos de nos perguntar como é que isso acontecerá em pormenor, mas seguirmos Jesus com a mesma total confiança em Deus-Pai, que nos salva e nos manterá para sempre perto d’Ele.
A resposta às interrogações sobre uma vida após esta vida, leva-nos a voltar os olhos para a vida presente, porque a nossa vida presente, no momento da nossa partida para a casa do Pai "não será destruída, será transformada", como diz o prefácio da missa pelos defuntos.
Que forma assumirá esta transformação, permanece um mistério!
Mas porque Jesus ressuscitou, vencendo a morte para sempre, podemos acreditar que estaremos juntamente com Ele e que podemos confiar no Amor do Pai de Jesus e nosso Pai, que nos guardará junto d’Ele, para sempre.
A ressurreição de Jesus não é uma reanimação de um cadáver, como aconteceu com Lázaro e com o filho da viúva de Naïm, que voltaram a viver como antes, tendo um prolongamento desta vida, indo morrer mais tarde.
Se Abraão, Isaac e Jacob estão vivos, não é pelo facto de terem casado com mulheres e gerado com elas filhos, mas pelo facto de serem eles mesmos «filhos de Deus» para sempre e recebedores da vida plena e definitiva junto de Deus.
Deus, como Jesus nos veio revelar, quer dar a todas as pessoas a Sua própria Vida para sempre.
Os primeiros cristãos utilizaram a palavra Ressurreição de Jesus, em união com o «primeiro nascido dentre os mortos».
Viam no Ressuscitado o início da ressurreição geral de todas as pessoas e a garantia da esperança na vida plenamente feliz em Deus.
O ser pessoal de Jesus é transformado na sua totalidade, por isso Ele ressuscitou corporalmente.
O Ressuscitado é o mesmo Jesus de Nazaré, mas um Jesus completamente realizado na sua Glória.
É através do corpo que podemos estar presentes a nós-mesmos, uns aos outros e ao mundo em geral.
Na nossa ressurreição, prometida por Jesus, isto é, no novo tipo de vida com Deus e em Deus, iremos estar em relação de Amor connosco e com todas as irmãs e todos os irmãos e para isso, teremos os nossos corpos transformados como o do Ressuscitado.
Como se realizará esta maravilhosa e grandiosa transformação, graças ao Amor de Deus, não o sabemos.
Mas, graças a Jesus Ressuscitado, já podemos ter a satisfação de entrar na transfiguração do nosso mundo, através de gestos e de atitudes de amor.
Pondo em prática o lema inventado pelos jovens participantes dum «campo de descoberta»:
Com Cristo vamos a isto!»
frei Eugénio op
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