Diálogo com o Evangelho do 33º Domingo do Tempo Comum, 13 de novembro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui.
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EVANGELHO (Lc 21, 5 - 19)
Naquele tempo, comentavam alguns que o Templo estava ornado com belas pedras e piedosas ofertas. Jesus disse-lhes:
«Dias virão em que, de tudo o que estais a ver, não ficará pedra sobre pedra: tudo será destruído».
Eles perguntaram-Lhe: «Mestre, quando sucederá isto? Que sinal haverá de que está para acontecer?».
Jesus respondeu: «Tende cuidado; não vos deixeis enganar, pois muitos virão em meu nome e dirão: "Sou eu"; e ainda: "O tempo está próximo". Não os sigais.
Quando ouvirdes falar de guerras e revoltas, não vos alarmeis: é preciso que estas coisas aconteçam primeiro, mas não será logo o fim».
Disse-lhes ainda: «Há de erguer-se povo contra povo e reino contra reino.
Haverá grandes terramotos e, em diversos lugares, fomes e epidemias. Haverá fenómenos espantosos e grandes sinais no céu».
Mas antes de tudo isto, deitar-vos-ão as mãos e hão-de perseguir-vos, entregando-vos às sinagogas e às prisões, conduzindo-vos à presença de reis e governadores, por causa do meu nome.
Assim tereis ocasião de dar testemunho.
Tende presente em vossos corações que não deveis preparar a vossa defesa.
Eu vos darei língua e sabedoria a que nenhum dos vossos adversários poderá resistir ou contradizer.
Sereis entregues até pelos vossos pais, irmãos, parentes e amigos. Causarão a morte a alguns de vós
e todos vos odiarão por causa do meu nome;
mas nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá.
Pela vossa perseverança salvareis as vossas almas».
DIÁLOGO
Para a comunidade de Lucas este Evangelho poderia relacionar-se com o Templo de Jerusalém.
Talvez para nós hoje este texto nos faça lembrar as torres gémeas de Nova Iorque ou a COVID-19.
Jesus avisou as pessoas que estavam encantadas com a majestade do Templo:
«Dias virão em que, de tudo o que estais a ver,
não ficará pedra sobre pedra:
tudo será destruído».
Muitos dos que o ouviram descobriram tristemente que ele não previu uma calamidade longínqua, mas uma tragédia que veriam com os seus próprios olhos e lamentariam em completa confusão.
O Templo tinha sido a peça central da prática judaica e o lugar onde Deus habitava entre eles.
Segundo fontes antigas, o Templo do tempo de Jesus esteve em construção durante quase 50 anos e foi concluído apenas seis anos antes de os romanos o destruírem.
O que estava Jesus a dizer aos seus seguidores quando previu a destruição do Templo?
Enquanto evitava responder a perguntas sobre quando isso iria acontecer, chamou-lhes a atenção sobre o que significaria essa destruição.
Os charlatães iriam aparecer, fazendo-se passar por enviados de Deus.
Catástrofes naturais e sociais fariam parecer que o mundo estava a chegar ao fim, e o próprio povo de Deus seria perseguido por inimigos, por antigos amigos e mesmo por familiares.
Quanto à resposta às ansiedades das pessoas, Jesus apenas diz:
“nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá.
Pela vossa perseverança salvareis as vossas almas.”
Os fiéis que contemplavam os escombros do Templo tiveram de procurar dolorosamente o seu significado.
As ruínas testemunharam que a sua fé na importância do Templo tinha sido alterada, quando este foi destruído pelos romanos, no ano 70 da nossa era.
Alguns interrogavam-se mesmo se a sua fé em Deus tinha sido uma ilusão. Se tinha sido uma ficção reconfortante enquanto durou, mas que no final se reduzia aquilo a que Karl Marx chamou o «ópio do povo».
Não seria que o poder romano teria afinal vencido o Deus de Israel?
Outros questionavam a prática da sua fé na dependência das peregrinações e dos sacrifícios no Templo de Jerusalém.
Recordaram também que antes de haver um Templo, Deus tinha viajado com os seus antepassados, presente através da tenda d encontro.
Pode parecer-nos estranho que, quando Jesus alertou os discípulos para a perseguição e a destruição que iriam chegar, os tenha avisado para não tentarem preparar-se para se defenderem.
E porquê?
Porque se se começassem a preparar para se defender, teriam sido levados a travar batalhas fictícias.
Em vez disso, Jesus prometeu que quando chegasse o momento:
"Eu vos darei língua e sabedoria
a que nenhum dos vossos adversários
poderá resistir ou contradizer.”
Jesus diz aos seus discípulos de então e aos dos nossos dias, para não tentarem arquitetar defesas consideradas inteligentes e poderosas, pois será o próprio Deus que lhes dará o Seu Espírito, que lhes inspirará a sabedoria e as palavras certas para anular o poder dos adversários.
Se nos mantivermos firmes na confiança no que Jesus prometeu, não teremos nada a perder.
Jesus ofereceu uma esperança, firmemente apoiada na sua intimidade com Deus, em vez de estratégias de combate.
Hoje, em vez do Templo de Jerusalém destruído, vivemos com a memória de como o 11 de Setembro de 2001 transformou a convicção da invencibilidade da nação americana.
Também a pandemia do COVID-19, que se espalhou pelo mundo inteiro, nos ensinou que as fronteiras nacionais são divisões, mas que já não são mais, protetoras.
A recente agressão da Rússia contra a Ucrânia mantém-nos alertados para a constante ameaça de guerra nuclear.
Estas realidades são manifestações universais da verdade pessoal que todos conhecemos, mas que normalmente tentamos esquecer: estarmos vivos implica que somos mortais.
Se reconhecermos e vivermos essa mortalidade, como pessoas que sabem que nenhuma catástrofe ou desgraça, por maior que sejam, estão fora do alcance da Vida e do Amor de Deus, estaremos a dar testemunho que, com Jesus Ressuscitado, esse Amor é, e será sempre, o mais poderoso.
Quanto à resposta às ansiedades das pessoas, Jesus apenas disse: “nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá.”
Jesus dá um exemplo que ilustra até que ponto Deus nos conhece.
Contar os cabelos da nossa cabeça!
Que impossibilidade para nós e também que inutilidade!
Mas, esta ideia da contagem dos cabelos manifesta bem e com humor, até que ponto vai a intimidade e o conhecimento que Deus tem de cada um de nós.
Que estas palavras de Jesus tenham um eco profundo em nós, quando procuramos manifestar que é por causa d’Ele que temos atitudes que desencadeiam incompreensões e até perseguições, da parte dos nossos próximos.
Será esta persistência na confiança no Amor de Deus
que nos salvará.
frei Eugénio op
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