Diálogo com o Evangelho do Domingo de Cristo Rei, 20 de novembro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui.
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EVANGELHO (Lc 23, 35-43)
Naquele tempo, os chefes dos Judeus zombavam de Jesus, dizendo: «Salvou os outros: salve-Se a Si mesmo, se é o Messias de Deus, o Eleito».
Também os soldados troçavam dele; aproximando-se para Lhe oferecerem vinagre, diziam: «Se és o rei dos Judeus, salva-Te a Ti mesmo».
Por cima dele, havia um letreiro: «Este é o rei dos judeus».
Entretanto, um dos malfeitores que tinham sido crucificados insultava-O, dizendo: «Não és Tu o Messias? Salva-Te a Ti mesmo e a nós também».
Mas o outro, tomando a palavra, repreendeu-o: «Não temes a Deus, tu que sofres o mesmo suplício? Quanto a nós, fez-se justiça, pois recebemos o castigo das nossas más ações.
Todos conhecemos o santuário de Cristo Rei, em Almada. A estátua de Cristo sobre uma torre de mais de 110 metros de altura, lembra-nos espontaneamente a estátua do Cristo Rei no Pão de Açúcar no Rio de Janeiro.
Estas duas enormes estátuas são o resultado de um desejo de tornar visível o que celebramos hoje: Cristo, Rei do Universo.
A festa de Cristo-Rei nasceu num contexto em que a Igreja, em várias zonas do mundo e sobretudo na Europa, foi desvalorizada
e despojada dos seus bens no século XIX, e onde, no início do século XX, uma secularização intolerante se espalhava com força.
É neste contexto que a imagem da realeza de Jesus Cristo foi cada vez mais utilizada.
O Papa Pio XI instituiu em 1925 a festa litúrgica de Cristo-Rei.
O famoso cântico "Christus vincit, Christus regnat, Christus imperat" (Cristo vence, Cristo reina, Cristo impera) tornou-se o cântico que unia milhares de católicos em todas as partes do mundo.
Até há alguns anos atrás, ainda era o sinal da Rádio Vaticano.
A imagem da realeza que foi utilizada desta forma foi muito desmotivante para aqueles que viviam em democracia e na igualdade entre os cidadãos.
Na Bíblia a realeza é apresentada como um dom de Deus que está longe de ser a imagem dos governantes comuns.
O rei é um "consagrado". Jesus foi "ungido".
Assim, Jesus é Aquele que o Pai escolheu para trazer a Boa Nova e que se reconhece, Ele-Mesmo, como o Eleito de Deus, Consagrado e Ungido. O famoso episódio em que Jesus faz a leitura do livro de Isaías na sinagoga de Cafarnaum descreve muito bem o que se passou:
"O Espírito do Senhor está sobre Mim, porque o Senhor Me consagrou pela unção. Ele enviou-Me para trazer a Boa Nova aos pobres, para proclamar libertação aos cativos e recuperação da vista aos cegos, para libertar os oprimidos, para proclamar um ano favorável do Senhor. (Luc. 4,18-19)
Não podemos falar da realeza de Jesus sem apresentar esta unção que o torna Sacerdote, Profeta e Rei e na qual participam todos os batizados, como nos ensinou o Concílio Vaticano II, e que o Catecismo da Igreja Católica retoma quando diz: "Jesus Cristo é aquele a quem o Pai ungiu com o Espírito Santo e constituiu 'Sacerdote, Profeta e Rei' ".
Todo o Povo de Deus participa nestas três funções de Jesus Cristo e assume as responsabilidades de missão e serviço que delas decorrem" (n.° 783 do Catecismo da Igreja Católica).
Como podemos ver, a realeza de Jesus não nos orienta para o reino do poder, mas sim para Aquele de quem provém todo o poder, toda a glória e toda a majestade: Deus Pai, que nos envia o Seu Filho.
É Deus Pai que envia o Seu Filho para nos salvar e nos levar até Ele.
Nesta festa de Jesus Cristo, Rei do Universo, o evangelista Lucas diz-nos que quando Jesus estava a morrer, os seus torturadores zombaram d’Ele, insistindo, que se Ele fosse de Deus, deveria ser capaz de se salvar a si próprio como tinha salvo tantas outras pessoas.
O letreiro colocado na cruz, acima da sua cabeça, proclamava o seu crime: "Este é o Rei dos Judeus", e era a fonte de todos os insultos.
Não era uma situação nada apelativa, nem entusiasmante.
Este rei morria, suspenso na tortura da cruz e rejeitado pelas autoridades civis e religiosas.
Para os Romanos, Ele não significava nada de importante.
Para a elite religiosa judaica, Ele era uma ameaça moral, e talvez até mortal.
Para a maioria dos seus discípulos, tinha-se tornado um perigo e um aparente fracassado.
No entanto, algumas das pessoas de condição mais baixa, à sua volta, viram algo mais.
Por exemplo, algumas mulheres continuaram a acompanhá-Lo, oferecendo-Lhe a única coisa que podiam: a sua presença confiante, dolorosa e chorosa.
A graça salvadora, neste momento decisivo e dramático, manifestou-se quando Jesus, moribundo, respondeu a um dos dois criminosos que partilhavam a mesma sentença que Ele.
Para lá das aparências e da própria razão, um dos companheiros de condenação disse: «Jesus, lembra-Te de mim, quando vieres com a tua realeza».
Jesus respondeu-lhe:
«Em verdade te digo: Hoje estarás comigo no Paraíso».
O pedido, "lembra-te de mim", ressoa com um significado bíblico. O êxodo do povo de Israel, saindo do Egito, aconteceu porque Deus se lembrou da aliança realizada entre Ele e o povo e resolveu agir. (Êxodo 2,24)
Quando Jesus, antes da sua morte, na última ceia, abençoou o pão da sua oferta pessoal, disse aos seus discípulos que fizessem o mesmo em sua memória.
Jesus prometeu ao seu companheiro crucificado que ele não só iria partilhar a Sua morte, mas também a Sua vida.
O Evangelho de hoje retrata um Jesus aparentemente sem qualquer poder: derrotado aos olhos do mundo e a morrer aos olhos de um Deus impotente para o salvar, ou então, desinteressado do que Lhe estava a acontecer.
Na solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Rei do Universo, recordemos o verdadeiro Jesus: rejeitado e escarnecido, Ele como sendo incapaz de parar a violência.
Recordemos que Ele reinou através do Amor ativo, mesmo quando sofreu e morreu.
Quando Deus O ressuscitou, apesar de Ele ainda carregar as marcas do sofrimento, foi o Amor que continuou a reinar.
A nossa fé proclama com insistência que o Amor é o único poder capaz de vencer o mal.
Como imagem viva do nosso Deus, é esse Amor e só Ele, que somos chamados a recordar e a tornar presente nas nossas vidas.
frei Eugénio op
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