Depois de ler com atenção, e reler duas ou três vezes, o texto publicado no jornal
i que o Paulo inseriu no Regador, não pude deixar de fazer este comentário.
Começo por dizer que nada tenho quanto ao facto de as mulheres poderem vir a ser ordenadas para exercerem um sacerdócio católico e muito menos quanto àquelas que se possam afirmar como teólogas. Conheço mulheres que poderiam estar, legitimamente, nesta situação e penso que quando Jesus se refere ao homem não se está a referir, seguramente, ao homem como género mas ao ser humano na sua totalidade. Se assim não fosse, então só os homens poderiam aspirar à salvação o que contrariava desde logo a ideia de um Deus de Amor.
De facto, se há lição do Evangelho que se pode tirar, sem grandes análises ou interpretações teológicas, é de que Jesus deu uma particular atenção à mulher, como se depreende de múltiplas passagens nele relatadas. Jesus conduz a mulher para uma situação de dignidade que, na altura, lhe era negada, como lhe é ainda negada, em múltiplos aspectos, nas sociedades mais primitivas ou mesmo nas sociedades modernas. A figura feminina é parte intrínseca de toda a vida evangélica de Jesus, acompanhando-O nas mais diversas situações e tem um papel de grande relevo na sua vida, sendo a mulher elevada a um estatuto de dignidade de ser humano que, na altura, só era reconhecido ao homem.
Mas vamos aos factos que estão plasmados no artigo inserto no Regador. Serão, eventualmente, um retrato pobre da pessoa que é entrevistada pelo que a minha análise não se refere à mesma mas, simplesmente, ao que é escrito e que pode não traduzir com correcção o pensamento ou a pessoa que está por trás.
Em primeiro lugar, não posso deixar de estranhar a forma, aparentemente elogiosa, como se fala de uma atitude que, sem outra explicação, não pode deixar de justificar o “horror” com que algumas pessoas terão visto a situação da entrevistada, não negada no texto, de abandonar, com aparente frieza, um filho recém-nascido. Sem querer julgar factos ou situações que não conheço, como comecei por dizer, não posso deixar, também, de ficar perturbado com uma atitude de “abandono” de um filho recém-nascido, com o desprendimento que as palavras aparentemente traduzem, pois a maternidade, não sendo imposta, deve ser assumida por inteiro e com a responsabilidade de criar laços afectivos por todos conhecidos como essenciais a um saudável desenvolvimento de uma criança. E, já agora, com tanta interpretação psicanalítica no resto do texto, não terá essa teoria permitido perceber esta importância da presença da figura feminina para o saudável crescimento e formação da pessoa do recém-nascido?
Em segundo lugar, não posso deixar de questionar o que se pretende chamar de “teologia feminista”. Será que há uma teologia para cada sexo? Pela minha parte, nunca ouvi falar de “teologia machista”. Aliás, as simples palavras feminista e machista já mexem comigo como cristão pois tenho para mim que Jesus não distinguia homem de mulher, não pregou uma Boa Nova para os homens e outra para as mulheres. Pelo que, ironizando, nunca vi Bíblias de cores diferentes para o sexo masculino ou feminino.
Certamente irão pensar muitos dos que venham a ler estas palavras que não passo de um machista. Aceito esse risco porque, em verdade e tendo por testemunhas aqueles que me conhecem, para não falar d’O que me conhece, nenhum pensamento machista prespassou jamais pela minha mente. Só que não gosto destas modernices como a do dia da mulher tal como está concebido e que, para mim, só legitimaria o, felizmente inexistente, dia do homem.
Quanto à ordenação das mulheres e ao seu papel na vida de família, tenho a mesma opinião no que respeita à vida dos homens ordenados. Devendo ser, para mim, o celibato uma opção dos ordenados sacerdotalmente, sejam homens ou mulheres, então, sejam homens ou mulheres, todos tem particulares responsabilidades em relação à vida comum que queiram assumir, se essa for a opção, responsabilidades que podem ser diferentes, não porque os géneros são diferentes mas porque são diferentes os carismas de cada um.
Quanto à análise das figuras femininas que, de forma mais proeminente, aparecem no Evangelho, a figura de Maria, mãe de Jesus, e a figura de Maria Madalena, a qual não me parece ter liderado nenhum grupo de mulheres no tempo de Jesus, essa análise para além de uma estrema superficialidade é desadequada no pensamento cristão.
Quanto se fala de Maria e da sua virgindade como se esta fosse um opróbrio e não uma consequência de uma livre vontade de decidir por parte da mulher, está-se a denegrir aquilo que é uma virtude exercida por opção. Não falo, por isso, da virgindade como um bem absoluto, mas como uma virgindade que não confunde sexo com sexualidade, construída e legitimamente assumida numa relação de verdade com o outro e em que a partilha é afectiva e não por mero impulso primário. E assumir uma interpretação psicanalista da pessoa de Maria, sendo um exercício teórico admissível, não é a meu ver uma forma adequada para discorrer sobre a sua virgindade pois tal é feito recorrendo a uma teoria em que o sexo é elevado à condição de motor de toda a vida do ser humano. Por outro lado, para mim, a conciliação da figura de mãe e de virgem apontada no texto é sempre possível quando assumimos que a virgindade, no geral das mulheres, não está no facto de existir uma relação sexual com um homem mas na forma como essa entrega é realizada (já agora por parte dos dois pois ser virgem pode ser uma condição a assumir sem vergonha pelo homem). Ou seja, para mim, virgindade tem a ver com pureza de pensamento e não com acto sexual.
Por outro lado, questionar a virgindade de Maria é questionar o poder do nosso Deus e Senhor de fazer em nós maravilhas que ultrapassam o nosso entendimento. Poderemos ter dificuldade em entendê-las pois só a verdadeira Fé, que é fruto do Espírito de Deus, nos pode permitir assumi-las. É verdade que o Senhor poderia ter escolhido um nascituro para nele infundir o seu Espírito. Mas não seria então mais difícil aceitá-lo? Não estaria esse nascituro longe do que vinha a ser anunciado e profetizado? E, então, Deus Criador do homem iria destruir uma vida por Ele criada para se poder manifestar já que antecedendo a sua vinda Deus tinha permitido que um ser nascesse fruto de um acto criador que Ele preparou para depois nele se manifestar? Sendo assim, não é muito mais fácil perceber que Deus se manifesta nessa Mulher descendo até ela e nascendo como homem para com eles se identificar sem perder a sua divindade e sem destruir o que já tinha criado?
Muito mais e com adequada correcção teológica ou mesmo cultural poderia ser dito, mas não é fácil a um não teólogo e ignorante, como é o meu caso, escrever sobre um assunto tão complexo. Contudo, apesar dessa minha ignorância, não posso deixar de entrar nesta polémica, mesmo correndo o risco do ridículo, pois não aprecio a ligeireza com que alguns textos são publicados. E volto a referir que a minha análise não é à mulher que está por trás deste artigo mas ao conteúdo do mesmo.
Hugo