2020-07-18

Diálogo com o Evangelho

Diálogo com o evangelho deste Domingo, 19 de julho, 16º do tempo comum, pelo Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Para ouvir clique aqui.




Aqui fica o texto do Diálogo do Frei Eugénio:


Evangelho de Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 13, 24 -33)



Naquele tempo, Jesus disse às multidões mais esta parábola:

«O reino dos Céus pode comparar-se a um homem que semeou boa semente no seu campo.

Enquanto todos dormiam, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo e foi-se embora.

Quando o trigo cresceu e começou a espigar, apareceu também o joio.

Os servos do dono da casa foram dizer-lhe:

‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo?

Donde vem então o joio?’

Ele respondeu-lhes: ‘Foi um inimigo que fez isso’.

Disseram-lhe os servos: ‘Queres que vamos arrancar o joio?’.

 ‘Não! – disse ele – não suceda que, ao arrancardes o joio, arranqueis também o trigo.

Deixai-os crescer ambos até à ceifa e, na altura da ceifa, direi aos ceifeiros: ‘Apanhai primeiro o joio e atai-o em molhos para queimar; e ao trigo, recolhei-o no meu celeiro’».

Jesus disse-lhes mais duas parábolas:

«O reino dos Céus pode comparar-se ao grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. Sendo a menor de todas as sementes, depois de crescer, é a maior de todas as plantas da horta e torna-se árvore, de modo que as aves do céu vêm abrigar-se nos seus ramos».

«O reino dos Céus pode comparar-se ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha, até ficar tudo levedado».



DIÁLOGO



 Caros leitores, nesta parábola Jesus aborda duas das questões sobre as quais a humanidade sempre se interrogou:
- Donde vem o  Mal que se encontra por todo o lado à nossa volta, mesmo quando talvez ninguém o queira ter  provocado ?
- Como acabar de modo eficaz com as várias formas de Mal ?

Nesta parábola o joio, também chamado cizânia, que aparece  no meio do trigo, é o símbolo do Mal em acção no mundo.
Na primeira parte da parábola Jesus conta-nos a reacção dos servos do dono do campo surpreendidos pelo aparecimento do joio e que o querem arrancar. Querem arrancá-lo e destrui-lo logo na raiz e, assim, impedir que ele cresça e venha a fazer mal ao trigo.
Perante as variadas formas de Mal que nos atingem, é habitual termos a mesma reacção que esses servos: perante um Mal queremos que este seja eliminado, destruído  para que o Bem possa ser vivido em paz.
Querer acabar o mais rapidamente possível com todas as formas de Mal que nos atinjem e querer neutralizar  os causadores do Mal é um desejo profundo em nós.

A primeira resposta do senhor do campo é atribuir o aparecimento do joio, isto é do Mal, a um inimigo.
Mas a resposta sobre como reagir ao aparecimento do joio é que é a mais surpreendente: «Deixai-os crescer ambos até à ceifa».
Na linguagem bíblica a «ceifa» ou a «colheita»  significa o fim do mundo, que é acompanhado do julgamento final de Deus, que tudo conhece sobre a verdade de cada pessoa e que dará a sua sentença com uma justiça perfeita .
Esse julgamento terá um duplo efeito: a salvação e a libertação de uns e a condenação dos outros, simbolizada pela destruição e pelo fogo.

Quando Jesus anuncia que vem inaugurar uma nova era, a do Reino de Deus já presente e em acção entre nós, aqueles que o ouvem esperam que o julgamento de Deus se manifeste em breve, dando-se assim início a um reinado sem Mal nem desamor.
O próprio João Batista e alguns dos discípulos de Jesus esperavam para breve  esse julgamento que destruiria para sempre o Mal e os maus e deixaria em paz os justos.

Em variadas situações da história do mundo, o Mal é causador de sofrimentos terríveis e só uma força prodigiosa o poderá destruir.
Os crentes das várias religiões e crenças nessas ocasiões contam que Deus o todo-poderoso destrua quanto antes esse Mal e os seus causadores.
Os não-crentes contam que surjam forças humanas capazes de causar essa destruição do Mal de forma libertadora.

Mas na parábola, o dono do campo vai colocar essa separação definitiva entre o Bem que permanece  e o Mal que é destruído somente no final dos tempos.
Com esta parábola Jesus diz-nos que no coração humano e em todas as formas de sociedades até ao fim do mundo, irão permanecer juntos o Bem e o Mal, a luz e as trevas, a boa semente e o joio.
Deus, por razões que não sabemos, e que Jesus também não nos revelou, quis que esses opostos permanecessem dentro do coração humano e não quis refazer a nossa natureza, de maneira a que nela apenas houvesse boa semente.
E aqui, chegamos ao segundo tema da parábola: a oposição entre a impaciência dos empregados, que nós também temos e a espera paciente do dono do campo, que representa Deus.
Às vezes temos uma grande pressa em julgar e condenar,  pôr dum lado os bons (e os mais-ou-menos bons) e do outro os maus que é preciso neutralizar.
Ao contrário, Deus sabe esperar. Ele olha para o «campo» da vida de cada pessoa com paciência e misericórdia: vê muito melhor do que nós a maldade e o Mal, mas também vê as sementes do Bem e espera até ao fim de cada vida, que elas venham a amadurecer.
Deus é paciente, sabe esperar.
O nosso Deus é um Pai paciente que nos espera sempre para nos receber de braços abertos.
A atitude do dono do campo é a da esperança fundada na certeza de que o Mal não é a primeira nem a última palavra.

As duas outras pequenas parábolas apresentam o dinamismo fortíssimo do Reino de Deus graças ao Amor.
As sementes de mostarda que são pequeníssimas (menos de 2 mm) dão uma grande planta que até parece uma árvore e que se pode encher de passarinhos.
E o pouco fermento que aquela dona de casa põe para levedar 60 quilos de farinha (as duas medida de que fala o evangelho) que vão dar de comer a muito mais de que uma família, até cerca de 150 pessoas. É uma festa que tira tanta fome!
É assim o poder do Amor de Deus.
Se acreditamos nesse poder do Amor que já está presente no meio de nós, descobrimos que o poder do Mal só pode ser vencido de modo durável e verdadeiramente eficaz com  o poder do Amor.
Procurar combater o Mal com a destruição e a morte, faz-nos entrar na espiral da violência que voltará sempre.
Para Jesus e para aquelas e aqueles que acreditam que Ele não nos engana, nem traz ilusões, é com este Amor super-abundante que podemos, mesmo que seja a muito longo prazo, vencer o Mal em nós e no nosso mundo.

 frei Eugénio

 

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