Diálogo com o Evangelho do 4º Domingo do tempo comum, 28 de janeiro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui. (ainda não disponível)
Evangelho (Mc. 1, 21-28)
Jesus chegou a Cafarnaum
e quando, no sábado seguinte, entrou na sinagoga
e começou a ensinar,
todos se maravilhavam com a sua doutrina,
porque os ensinava com autoridade e não como os escribas.
Encontrava-se na sinagoga um homem com um espírito impuro,
que começou a gritar:
«Que tens Tu a ver connosco, Jesus Nazareno?
Vieste para nos perder?
Sei quem Tu és: o Santo de Deus».
Jesus repreendeu-o, dizendo: «Cala-te e sai desse homem».
O espírito impuro, agitando-o violentamente,
soltou um forte grito e saiu dele.
Ficaram todos tão admirados, que perguntavam uns aos outros:
«Que vem a ser isto?
Uma nova doutrina, com tal autoridade,
que até manda nos espíritos impuros e eles obedecem-Lhe!»
E logo a fama de Jesus se divulgou por toda a parte,
em toda a região da Galileia.
DIÁLOGO
A história que este relato do Evangelho nos conta sobre um homem com um «espírito impuro», também chamado um «espírito maligno»,
é uma, entre outras, onde aparecem «espíritos demoníacos» que tomam posse de pessoas.
Estes espíritos provocam gritos, atitudes e convulsões horríveis.
O que nós consideramos demoníaco e maligno é para outras pessoas pura ignorância científica sobre as doenças que afetam o sistema nervoso humano.
Alguém se lembra ainda do filme «O exorcista» que levantou grandes discussões há uns quinze anos?
Na mentalidade da época de Jesus, quer entre judeus, quer entre os que seguiam os cultos gregos e romanos, quase todas as doenças e enfermidades eram vistas como sendo provocadas por espíritos com poderes para desencadear o mal nas pessoas e por isso era necessário, além de certos cuidados médicos, fazer exorcismos para os expulsar.
As pessoas de Cafarnaum sabiam, por isso, o que eram os exorcismos e como eram feitos.
Os procedimentos eram demorados, cheios de fórmulas próprias para afastar esses espíritos e eram acompanhados de ritos que só certas pessoas, com poderes especiais, os podiam realizar para que produzissem efeito.
No relato que lemos, em perfeito contraste com esses exorcismos, Jesus diz apenas duas frases: «cala-te» e «sai desse homem» em precisar de fazer qualquer ritual.
As simples palavras de Jesus fizeram sair do homem o «espírito fazedor de mal».
Por outro lado, de modo muito surpreendente é precisamente o «espírito maligno» que vai dizer que sabe quem é Jesus.
Diz que Jesus «é o Santo de Deus», isto é o Deus Único, o Completamente Diferente de todas as criaturas.
Jesus aparece como Aquele, que apenas com a sua presença, já enchia de pânico os «espíritos malignos».
A admiração e o espanto que Jesus provocou nas pessoas, em Cafarnaum, não eram apenas fruto do poder de expulsar espíritos, mas também do modo como ensinava.
Jesus «ensinava com autoridade e não como os escribas».
Os escribas eram os que copiavam os textos da Bíblia, mas também os que a estudavam e a ensinavam a ler e a interpretar.
Eram os guardiões da tradição bíblica, o que os fazia repetir o mais exatamente possível as interpretações das passagens da Lei judaica recebida por Moisés.
Por sua vez Jesus não é um guardião da Tradição, mas o anunciador duma novidade vinda de Deus.
De onde vinha então a autoridade de Jesus?
Não tinha currículo, nem diplomas de escriba ou doutor da Lei, nem estatuto religioso por ser um fiel judeu comum, sem ser sacerdote, nem pertencia a nenhuma confraria como os fariseus ou partido como os saduceus.
A sua autoridade começava no seu dizer unido ao seu fazer.
A sua autoridade saía dos seus lábios e das suas mãos.
A sua autoridade vinha-lhe da sua completa união a Deus Pai, de quem era o porta-voz e o mensageiro.
O Amor de Deus-Pai é sua fonte.
Jesus, o Filho de Deus, é a perfeita transparência de Deus Pai e por isso pode, com toda a verdade, dizer ao apóstolo Filipe: «Filipe quem me vê, vê o Pai»
A principal ocupação de Jesus é de ser Anunciador do Evangelho de Deus.
Jesus tinha como principal função dar a conhecer a todas as pessoas e em todos os lugares, a Boa Notícia sobre quem Deus era e o que Deus queria para todas as pessoas humanas, suas filhas e seus filhos e para a criação.
Para poder anunciar o Evangelho, tinha que ensinar, mas ao mesmo tempo devia acolher todas as pessoas, tinha também de as libertar de todas as prisões interiores e exteriores e de curá-las espiritual e fisicamente.
Foi o que Ele viveu.
Se ainda hoje há cristãos e se esperamos que nas novas gerações também haja, tudo dependerá de haver quem aceite ser anunciador do Evangelho de Deus à maneira de Jesus.
No nosso tempo, continua a ser habitual que as pessoas considerem que na Igreja Católica e também nas outras Igrejas cristãs, quem tem a função de ser anunciador são os bispos e os padres e as anunciadoras devem ser as monjas e as religiosas.
Mas, felizmente, ao longo do tempo muitas das Anunciadoras e dos Anunciadores do Evangelho, a quem também devemos, hoje, sermos seguidores de Jesus, não tinham qualquer estatuto, nem diploma, nem título eclesiástico.
Essas mulheres e esses homens de fé, apenas se apoiaram na fidelidade a Jesus e na Sua mensagem que lhes foi confiada para ser anunciada.
Anunciaram, porque eram livres.
Também os há nos nossos dias!
Demos graças Deus se elas e eles entraram nas nossas vidas!
frei Eugénio, op (31-01-2021)
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