Diálogo com o Evangelho do XVIII Domingo do Tempo Comum, 4 de agosto, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui. (gravado em julho de 2021)
EVANGELHO (Jo. 6, 24-35)
Naquele tempo,
quando a multidão viu
que nem Jesus nem os seus discípulos estavam à beira do lago,
subiram todos para as barcas
e foram para Cafarnaum, à procura de Jesus.
Ao encontrá-l’O no outro lado do mar, disseram-Lhe:
«Mestre, quando chegaste aqui?».
Jesus respondeu-lhes:
«Em verdade, em verdade vos digo:
vós procurais-Me, não porque vistes sinais,
mas porque comestes dos pães e ficastes saciados.
Trabalhai, não tanto pela comida que se perde,
mas pelo alimento que dura até à vida eterna
e que o Filho do homem vos dará.
A Ele é que o Pai, o próprio Deus,
marcou com o seu selo».
Disseram-Lhe então:
«Que devemos nós fazer para praticar as obras de Deus?».
Respondeu-lhes Jesus:
«A obra de Deus
consiste em acreditar n’Aquele que Ele enviou».
Disseram-Lhe eles:
«Que sinal realizas,
para que nós vejamos e acreditemos em Ti?
Que obra fazes?
No deserto os nossos pais comeram o maná,
conforme está escrito:
‘Deu-lhes a comer um pão que veio do Céu’».
Jesus respondeu-lhes:
«Em verdade, em verdade vos digo:
Não foi Moisés que vos deu o pão do Céu;
meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do Céu.
O pão de Deus é o que desce do Céu
para dar a vida ao mundo».
Disseram-Lhe eles:
«Senhor, dá-nos sempre desse pão».
Jesus respondeu-lhes:
«Eu sou o pão da vida:
quem vem a Mim nunca mais terá fome,
quem acredita em Mim nunca mais terá sede».
Palavra da salvação
DIÁLOGO
No diálogo, que acabámos de ler entre Jesus e o povo que o seguia, há a referência ao que aconteceu ao povo judeu na travessia do deserto do Sinai, no êxodo a partir do Egipto, onde os judeus eram escravos, para a Palestina, a terra prometida por Deus.
Durante esse êxodo, o povo, com frequência, fazia reclamações a Deus, através de Moisés. Deus, para minimizar essas queixas, respondia com a oferta diária do “maná”.
O que é o “maná”?
O “maná” é uma segregação granulosa e aguada, do tamanho de sementes de coentros, de cor branca e com sabor a mel. É produzido por uma planta quando é picada por um inseto, que naquela época existia desde o Irão até ao Norte de África, incluindo a península do Sinai.
O maná é uma substância muito nutritiva, que permitiu àquele povo alimentar-se e sobreviver durante os longos anos da travessia do deserto.
Muitas vezes este alimento não era reconhecido como uma manifestação do cuidado de Deus pelo Seu povo e um gesto concreto da Sua Providência.
No Evangelho que lemos, as pessoas que procuravam Jesus e que iam ter com Ele, estavam motivadas pelas necessidades básicas da vida, sobretudo alimentação e saúde.
Como eles, também nós, preferimos o pão, que nos faz viver, sentimo-lo na boca, saboreamo-lo, é concreto e imediato.
Ao passo que Deus e a vida eterna, são frequentemente ideias, que podem vir ou partir, mas que pouca influência têm na vida do dia-a-dia.
Jesus tinha clara consciência que esta ânsia das pessoas em irem ao encontro d’Ele era motivada pela oferta tão generosa e gratuita de pão e de peixe, do dia anterior.
Diante dessas pessoas, Jesus anuncia a sua pretensão fundamental: assim como Eu saciei num só dia a vossa fome do corpo, também posso preencher as profundidades da vossa vida.
Estabelece-se então um diálogo em dois planos diferentes. Perguntam; qual é a obra de Deus?
Mas que coisa, especificamente, dá o Deus de Jesus?
Nada entre as coisas ou os bens de consumo: «Ele não pode dar menos do que dar-se a Si Mesmo.
Mas, dando-se a Si Mesmo, dá-nos tudo» disse Catarina de Sena, na sua sabedoria inspirada.
O dom de Deus é o próprio Deus que se dá.
Jesus responde, apresentando-se Ele próprio como sendo o rosto amigo de Deus.
Jesus declara que é Ele o “Pão da Vida” e que quem for ao seu encontro nunca mais terá fome.
É Ele, só Ele, que dará "o alimento que permanece na vida eterna".
O «Pão da Vida» vem dar vida não só aos hebreus, como aconteceu no deserto, mas às pessoas do mundo inteiro, ou seja, a toda a humanidade. Uma promessa de proporções prodigiosas!
Jesus tinha partilhado os pães com a multidão entusiasmada, que só queria a repetição do milagre.
Agora, Jesus revela que o autêntico dom de Deus é o próprio Doador, o enviado de Deus ao mundo, a quem devemos responder, estando onde Ele está, partilhando com Ele a nossa própria vida, «onde quer que Ele vá».
Devemos procurá-lo por Si Próprio, irmos ter com Ele e pormos toda a nossa confiança n’Ele.
A obra de Deus é uma corrente de amor que entra em cada um de nós e faz florescer as raízes de cada ser humano, para que se torne, como Ele, dador de vida.
No coração da fé está a firme confiança de que a obra de Deus é Jesus: rosto luminoso de ser humano, livre como ninguém, curador do desamor, que vem ao nosso encontro para que nos tornemos no melhor daquilo que podemos ser.
O trabalho da fé em Jesus, é o trabalho da confiança em Jesus, que nos pode transformar por dentro, se nós O deixarmos.
Não é tanto “o que devo fazer”, mas “o que devo deixar fazer em mim” pelo Espírito de Jesus.
Poderíamos dizer que “o trabalho a fazer” é deixarmos que ”Jesus nos trabalhe e nos transforme”.
frei Eugénio, op (01.08.2021)
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