2022-10-15

Diálogo com o Evangelho

Diálogo com o Evangelho do 29º Domingo do Tempo Comum, 16 de outubro, por Frei Eugénio Boléo, no programa de rádio da RCF "Construir sur la roche". Pode ouvir aqui

 


 https://www.evangile-et-peinture.org

 

Evangelho (Lc. 18,1-8) 

Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos uma parábola sobre a necessidade de orar sempre sem desanimar:
«Em certa cidade vivia um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens.
Havia naquela cidade uma viúva que vinha ter com ele e lhe dizia: "Faz-me justiça contra o meu adversário".
Durante muito tempo ele não quis atendê-la. Mas depois disse consigo: "É certo que eu não temo a Deus nem respeito os homens;
mas, porque esta viúva me importuna, vou fazer-lhe justiça, para que não venha incomodar-me indefinidamente"».
E o Senhor acrescentou: «Escutai o que diz o juiz iníquo.
E Deus não havia de fazer justiça aos seus eleitos, que por Ele clamam dia e noite, e iria fazê-los esperar muito tempo?
Eu vos digo que lhes fará justiça bem depressa. Mas quando voltar o Filho do homem, encontrará fé sobre a Terra?»

 

DIÁLOGO 

Esta passagem do Evangelho é utilizada com frequência por pessoas cristãs, para recomendarem que rezemos novenas após novenas para obter da parte de Deus algo de importante para as suas vidas.

 

Também serve para reforçar propostas piedosas dizendo: "Mais alguns terços e a Santíssima Virgem certamente convencerá Jesus a fazer o que pedimos"!

 

Nos Evangelhos, nas passagens que se referem a Maria, Jesus não dá um tratamento ou um poder especial à sua mãe.

 

Além disso, Jesus disse muito claramente:

"Nas vossas orações não useis de vãs repetições, como os gentios, porque imaginam que é pelo palavreado excessivo que serão ouvidos." (Mat. 6,7).

 

A seguir a esta chamada de atenção, Jesus oferece aos discípulos a possibilidade de rezarem a sua própria oração: o Pai-Nosso.

 

A persistência a que Jesus se refere, quando fala da “necessidade de rezar sempre sem desanimar”, não tem a ver, seguramente, com a multiplicação de palavras em numerosas orações.

 

Quando Jesus nos diz para rezarmos sem perder o ânimo, está a convidar-nos para entrarmos no seu próprio caminho espiritual.

Nós dizemos que acreditamos no Deus de Jesus, o Deus que tem um projeto para a História humana, que nos dá a conhecer sobretudo através de Jesus.

 

Esta convicção, implica que a História da Humanidade esteja a caminho de uma realização que irá muito para além daquilo que podemos imaginar.

 

Rezar sem cessar é uma imitação do que Jesus vivia.

Ele estava constantemente atento e aberto a receber e a seguir a Vontade de Deus.

 

Os textos bíblicos que chegaram até nós, neste nosso tempo, dirigem-se em grande parte a pessoas, que sendo responsáveis, se sentem sobrecarregadas de situações pessoais, familiares, profissionais e sociais cheias de inseguranças e provações e que obrigam a discernimentos difíceis.

 

Estas pessoas também estão muito preocupadas com as evoluções climáticas, sociais e políticas do nosso mundo.

 

Os textos bíblicos chamam-nos a atenção para Deus como criador, mas também como um Pai.

Ele interessa-se por cada uma e cada um e quer também que façamos os possíveis por vivermos uns com os outros em bom entendimento.

 

Os textos bíblicos incitam-nos a rezar, porque rezar é a única forma de nos abrirmos para permitir que o Espírito de Deus aja, com poder e criatividade, através de nós e entre nós.

 

Jesus vai contar a parábola da viúva que importuna o juiz com tanta insistência, que até vai conseguir que justiça lhe seja feita.

 

No entanto, ela tem todos os motivos para se sentir desencorajada: a sua causa parece estar perdida de antemão, desde que teve a pouca sorte de se deparar com um juiz que não quer saber nem da Vontade de Deus, nem da prática correta da justiça.

 

Mas ela persiste, porque está convencida que a sua causa é justa.

Ela não põe em dúvida, nem por um momento, que não tenha razão.

O que ela está a pedir é que a Vontade de Deus se faça.

 

Este exemplo da viúva, que Jesus nos apresenta, é antes de mais um exemplo de humildade.

 

Se ela insistia com o juiz, é porque ela estava em necessidade.

A primeira condição para participarmos no Reino de Deus é reconhecermos a nossa pobreza, a nossa dependência do querer doutros.

 

É a primeira bem-aventurança: "Bem-aventurados vós, que sois pobres, porque vosso é o Reino de Deus" (Luc 6, 20).

Na nossa expectativa de entrarmos no Reino de Deus já neste mundo, somos desafiados a sermos tão persistentes como esta viúva cheia de coragem e confiança na bondade e na justiça de Deus.

 

Estará Lucas a dirigir-se a uma comunidade ameaçada pelo desânimo?

 

Podemos pensar assim, dada a última frase: «Quando o Filho do Homem vier, irá encontrar fé na terra?»

Reparemos que é uma frase curiosa.

 

A primeira parte diz: «O Filho do Homem, quando ele vier» é uma afirmação cheia de certeza.

 

Mas a segunda parte da frase: «irá encontrar fé na terra?», à primeira vista, parece pessimista, mas de facto não é uma dúvida, mas um alerta, um forte apelo à vigilância.

 

Os primeiros cristãos, confrontados com incompreensões e perseguições, começaram a achar que o Reinado de Deus demorava muito a chegar. E foram tentados pelo desânimo.

 

Também eles deviam lembrar-se que Deus queria a sua salvação, e Lucas recorda-lhes, com esta parábola, que Jesus punha em valor a sua perseverança.

 

Os cristãos, quer os do tempo em que Lucas escreveu o seu Evangelho, quer os de hoje, são convidados a não desistir.

Acreditar é, assim, uma recusa a desanimar.

 

A última frase de Jesus: "Quando o Filho do Homem vier, irá encontrar fé sobre a terra?" é uma forte chamada de atenção, válida para todos os cristãos em todos os tempos e todos os lugares, é como se Ele nos dissesse: «Tenham cuidado, pois se não estiverem vigilantes, acabarão por deixar de acreditar.»

 

Esta parábola é uma lição importante sobre a fé.

A última frase faz a pergunta sobre a fé e a primeira frase diz precisamente em que consiste a fé: «Devemos sempre rezar sem nos desencorajarmos», entre as duas partes, o exemplo que nos é proposto por Jesus é o da viúva que é tratada injustamente, mas que não desiste.

 

Jesus sabe bem que, desde a manhã da sua ressurreição até à Sua vinda definitiva no final dos tempos, a fé será sempre um combate contra o desânimo.

 

Não faltarão as «aves de mau agoiro» para semear a dúvida e não faltarão os falsos mestres a alimentar as suspeitas e a criar grandes medos.

Esta espera pelo Reino de Deus presente entre nós, continua a parecer uma interminável expectativa.

 

Estará Deus realmente presente e atuante no meio de nós, com o Seu Amor?

O exemplo desta pobre viúva injustiçada chega-nos em momentos decisivos nas nossas vidas, quando somos tão indigentes e pedintes como ela.

Procuremos ser tão persistentes e corajosos como ela.

 

A viúva teve sempre esperança que iria ser atendida.

Ela teve a certeza, na fé, duma resposta de Deus e duma eficácia escondida, que não seria automática, que muitas vezes demoraria e que podia mesmo demorar muito.

 

Se Deus demora a dar uma resposta, consegue ao mesmo tempo ter-nos mais tempo perto d’Ele.

 

A oração constante é um combate contra o desencorajamento.

 

A perseverança na oração é um grande dom, que devemos pedir a Deus, com insistência e confiança.

 

   frei Eugénio op

 

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